
Os dados da ABREMA escancaram uma realidade alarmante e, ao mesmo tempo, repleta de oportunidades perdidas: o Brasil patina em um aproveitamento irrisório de seus resíduos urbanos. Apenas 8,3% de todo o material descartado, abrangendo desde a rica fração orgânica até os valiosos recicláveis e a inevitável parcela de rejeitos, trilha o caminho do reaproveitamento efetivo. Enquanto uma parcela, ainda que insuficiente, encontra destinação tecnicamente adequada em aterros sanitários controlados – reconhecidamente a solução ambientalmente mais correta para o rejeito e para a estabilização da matéria orgânica –, uma fatia considerável e inaceitável alimenta lixões irregulares, perpetuando a contaminação insidiosa de nossos solos, da qualidade do ar que respiramos e da preciosidade de nossos recursos hídricos.
Este panorama de ineficiência configura um colossal desperdício de recursos intrínsecos ao próprio resíduo. Matéria orgânica, metais, plásticos, vidro – todos carregam consigo o potencial latente de se transformarem em vetores de energia limpa, em insumos para novos ciclos produtivos, em catalisadores para a geração de empregos verdes e em propulsores de renda para comunidades e empresas engajadas na economia circular.
A emergência da conversão da matéria orgânica em energia, personificada por iniciativas como a da Gás Verde, sinaliza um horizonte promissor e tangível. A demonstração prática de que resíduos orgânicos e o biogás capturado em aterros sanitários podem ser elevados à categoria de #biometano – um biocombustível renovável com o poder de substituir fontes fósseis poluentes e mitigar as emissões de gases de efeito estufa – é um farol de inovação. Essa tecnologia, intrinsecamente mais limpa, transcende o benefício ambiental, atuando como motor para a criação de postos de trabalho qualificados e para o fortalecimento de uma economia genuinamente circular, onde o "lixo" é finalmente reconhecido como um recurso de valor inestimável.
A inflexão deste cenário de desperdício exige um avanço estratégico e multifacetado. O Brasil necessita urgentemente de um salto qualitativo na implementação de sistemas robustos de coleta seletiva, da erradicação definitiva dos lixões – focos de degradação ambiental e injustiça social – e de um arcabouço de incentivos que fomentem o aproveitamento energético dos resíduos, inclusive explorando o potencial energético dos aterros sanitários modernos. Enquanto a cultura predominante de descarte irregular ou a negligência em relação ao potencial energético dos resíduos persistirem, o país continuará a dilapidar recursos valiosos e a perder oportunidades cruciais para um desenvolvimento mais sustentável e resiliente. A gestão inteligente de resíduos não é um custo, mas sim um investimento estratégico no futuro do Brasil.